"Ademir era magro. Feito da dor e do cheiro das senzalas multiplicadas em favelas e bairros erguidos sobre paus finos em alagados fétidos. Atrevido, ria branco dos defeitos dos outros. Dos seus também. Controlava a bola do mesmo modo que alguém movimenta os olhos, sem se dar conta, por um sutil e incompreensível comando que remonta aos primórdios da vida, no borbulhar dos primeiros pântanos. E havia momentos em que a bola e seus olhos, na vastidão verde, assemelhavam-se a um solitário planeta com seus dois satélites. A estranha órbita compunha-se da leitosa parábola rumo ao gol e do percurso de volta, ao meio campo, por entre corpos adversários batidos e faces cabisbaixas, humilhadas." - Mayrant Gallo